A multidão junta-se numa turba imensa, os olhares são o dobro e as emoções um oceano. Ouvem-se cumprimentos e abraços e o silêncio dos nervosos.
As vedetas afundam-se nas cadeiras e as equipas à sua volta berram uma para cada lado. Não temam, todos se entendem, na ordem por decifrar que é o caos. Os semáforos piscam: vermelho, vermelho, verde, mas não se esperam arranques nem bandeiras ao xadrez. São leds, nunca semáforos à espera do cheiro a pneu queimado.
E cegos de flash’s de câmaras, de sorrisos loiros de loiras publicitárias, do suor intenso do nervoso, do verde do dinheiro estampado em milhares de testas e do brilho da fama gravado em centenas de peitos… caímos na realidade: estamos no próximo nível.
Bem-vindos à CPL Winter 2004.

Esta CPL adivinhava-se singular por plurais motivos, mas três souberam preencher os artigos acerca de eSports como mais nenhuns: seria a primeira CPL em que não veríamos SK.swe entre os mais distintos dos CS’ers mundiais e seria, também, a oportunidade de obtermos um cheirinho de como seria a World Tour. Não me interpretem mal, sei bem que já foi jogado PainKiller na CPL passada… mas a condição, atenção e sobretudo, o nível, era completamente diferente. Como se não fosse suficiente para nos pulsar ainda mais a veia, seria a CPL onde seria usado pela última vez o Counter Strike como o conhecemos. Mas adiante, de que conversa já encheu a religião o povo.

A CPL começou sem qualquer problema no primeiro dia para as equipas de topo. E apesar de os seedings terem sido ligeiramente contestados aqui e ali (e já chegaremos à minha opinião acerca disso) ninguém tropeçou no primeiro obstáculo. Tirando os dois defaults facultados pelos TAG (agora Team PC Gamer já que a AMD retirou-lhes o apoio financeiro) e pelos TitaNs (a capitalização do N distingue-os dos dinamarqueses estrelares, aparentemente) todas as outras equipas seedadas até 32º ganharam. É no segundo dia que as coisas aquecem.

O segundo dia começa logo com um grande jogo: mouz vs coL. E apesar de a equipa americana já ter captado algumas atenções antes da CPL (pela vitória da liga CAL-m e pelo segundo lugar na UGS-i onde perderam num bom jogo em nuke para os u5) ninguém jamais esperava uma performance destas. Ou se esperavam, eu não era um deles, devo admitir. Os americanos conseguiram não só levar os afamados alemães para overtime como conseguiram ganhar, depois de um dos novos ídolos americanos, tr1p, ter ganho um 1n2 a CT com a bomba há muito plantada, no último round. Os seedings falhavam pela primeira vez. Mas a segunda estava para breve: os suecos Begrip derrotam os TEC (relembro que levaram o “desconhecido” gouki em vez do velho gosu) por um round apenas, também em de_inferno. Como se não fosse suficiente, os aTTaX (com o ex-lineup dos ocrana) derrotam uns filandeses astralis demasiado enfraquecidos pelas perdas (tihOp e Guardian) para a rival DSky, a equipa que iriam tão deliciosamente -ou não- enfrentar caso tivessem ganho.
Mas o que talvez mais prazer sádico ofereceu a muito boa gente foram os SK.ger não terem conseguido fazer mais do que DOIS rounds contra os uns sempre fortes DIE. Relembro que um dos jogadores que deveria ter viajado com os europeus não conseguiu tratar do passaporte a tempo, pelo que recorreram ao jogador que tinha ganho o qualifier romeno com eles. Todos os outros jogos da segunda ronda correram sem sobressaltos de maior relevo.

É, finalmente, na terceira ronda que encontramos bastantes jogos espectaculares, onde os EYE mostram finalmente do que são capazes e violentam os mTw.se (lembram-se dos underdogs ICSU que espantaram meio mundo na nollelva?) e onde os NoA conseguiram cometer mais erros durante um jogo do que a defesa do Benfica. Ainda assim bateram os brasileiros mibr em overtime, revelando o que muita gente antecipava: pouca consistência. De resto, o mapa era Mill, e assumidamente um dos piores dos primeiros. Relembro também que as duas equipas *bootcamp’aram* juntas, cortesia dos coL, antes da CPL, o que talvez tenha facilitado a tarefa aos brasileiros. E como tudo neste mundo tende para o equilibrio, dizia Piaget, os Begrip caiem para os DIE pela mesma diferença que aqui os tinha trazido: um round. E aqui começam os Begrip a sofrer com o seeding que lhes foi atribuído. Uma equipa muito forte no segundo round e um candidato ao top10 no terceiro. De resto, uma nota de grande relevo aos Titans que depois de estarem a perder 11-4 (onde se começavam a notar as fraquezas defensivas sem o menino prodígio de quinze anos chamado WHiMP) deram a volta ao jogo, ganhando 16-12 a uns estupefactos u5.
A obrigação obrigou os GamerCo (antigos Rival e 3º’s na última CPL) a baterem os zEx (sem aimetti), os 3D a baterem os g3x e os DSky a tomarem conta dos aTTaX.
Finalmente, outro presente para os sádicos, os velhos 4K vergam-se perante a força da juventude, do desejo e do talento de outro menino maravilha que começa a abanar o mundo: coL.fRoD. Não me interpretem mal, eu já vi muito bom jogador. Eu já vi coisas do outro mundo, mas se o talento se medisse em peso este caricato miúdo de boné azul não era um rochedo, era um planeta. A tarefa, contudo, foi-lhe facilitada porque basta olhar para o lado terrorista dos 4K para perceber que pouco ou nada tinham praticado o mapa. Insistentes ataques cruzados para o mesmo BS e sem flash’s ou outras granadas tão pouco. Suficiente para um qualifier em inglaterra sem dúvida… medíocre para este nível.
Pela losers-bracket nada de relevante, por enquanto.

Ainda sem me poder apressar (e tê-lo-ei de fazer, pela proporção que resumir quatro dias num artigo tomaria) é aqui que a folha do torneio chega a um vinco. De_Nuke. Lembram-se 3D vs mibr? Lembram-se mibr vs g3x? Lembram-se SK vs TAG? Ou da EverLan em que os NoA ganharam e os u5 se queixaram? Pois bem, aconteceu de novo, o tão afamado FlashBug volta a atacar. Sem querer ou não o que é certo é que os NoA não são novos nisto. E se é certo que gato molhado tem medo de água os NoA já deviam saber melhor que isso.
Depois de uma primeira parte a Terrorista espectacular por parte dos NoA, que pareciam que avançavam ao ritmo das frag’s do shaGuar, na parte de fora, há um intervalo de minutos em que é discutido entre os admins e a demo é revista. Por causa do que está nas regras, os NoA não só perderam “na secretaria” essa ronda como todas as que se seguiram, transformando um 9-6 em um 5-10. A moral era baixa e o resultado também, a segunda parte foi um passeio no parque para os EYE. Destaque para a atitude de líder do XeqtR, levando embora elemeNt, quando este se mostrou agressivo para os admins.
Os coL continuaram a corrida até ao top5 batendo os Dsky (seed 27 contra 3) quase facilmente, depois de uma primeira parte a CT onde ganharam por nada menos que 13-2. Aconselho a verem o último round a CT dos coL. Atentem no fRoD. E não, eu NÃO sei como ele acertou aquele tiro na conduta. Acho que ninguém no mundo sabe. Nem a cabeça do natu que por esta hora ainda não foi encontrada.
Os GamerCo por seu turno, notem bem, ganharam 16-14 aos 3D depois de estarem a perder 12-3. Haja sorte e Torrez que salvem. Sem dúvida o homem do jogo. Se tivesse que votar na mulher votaria na Alice, a atenta acompanhante dos GamerCo. Com audiência daquela torna-se mais fácil .

A vez de dust2 eventualmente chega e é vez de os Titans sucumbirem completamente na mão dos EYE, confirmando o facto de terem um CT side muito pobre (embora d2 seja completamente “T-sided”), não conseguindo sequer fazer mais do que dois rounds. Os GamerCo começaram também a Terror e também ganharam contra coL, assegurando assim um lugar na final. Incrível, ainda assim, a performance do inevitável fRoD, que nunca precisou de mais de duas balas para entrar no B.
Os dois finalistas eventualmente encontraram-se no train para decidir quem jogaria as finais de consolação e devo admitir que foi um dos jogos que me falharam. Imperdoável? Nem pensar, a losers-bracket estava bastante mais interessante.

Este aparte – permitam-me – é onde olhamos para o percurso de uma equipa e pensamos “eu estoiraria”. Pois bem, foi o que acabou por acontecer aos Begrip que acabaram por jogar 6 jogos, salvo erro, no mesmo dia, durante os quais deixaram pelo caminho astralis, DSky, u5, 3D e Titans. Relembro, também, que a maioria desta equipa é constituída por ex membros dos agora mortos gamers.nu. Uma antiga medíocre equipa sueca. Juntem-lhes a consistência do Iskall e um teamplay soberbo e aí têm. Perderam apenas para NoA, depois de terem começado a CT em dust2: na final das losers. E para os mais interessados que se queiram deliciar atentem na demo Begrip vs 3D, no último round, e babem-se com a táctica. Infelizmente esta equipa não teve nem seed nem pairings que permitisse um melhor lugar, senão estou certo que o faria. Pessoalmente, trocaria o terceiro lugar dos GamerCo por este quarto. Repare-se que os GamerCo só tiveram equipas americanas pela frente, e quando não foram americanas, perderam (Forsaken, zEx, 3D, coL, EYE, NoA). É aqui que se nota a importância dos seedings e dos pairings que estes criam.

E chegamos, FINALMENTE, à finalíssima. O tira-teimas. Duas vezes Inferno. O apregoado mapa “mais táctico” de todo o Counter Strike – isto sujeito a opiniões de cada um de vocês. “THIS IS OUR GAME, THIS IS OUR TOURNAMENT” berrava shaGuar. Walle sorria. De facto, todos os EYE sorriam, à excepção do archie e do bullen mas apenas porque é um personagem demasiado… enigmático – sou simpático – para isso. O Xeqtr artilha a cadeira com duas almofadas. Ganhe ou perca não irá sair daqui com o rabo dorido. Walle sorri de novo. Mas já o ditado dizia, quem sorri por último sorri melhor – ou qualquer coisa do género.
LETS GO GUYS, WIN THE PISTOLS!” continuava o shaGuar, como se não tivesse uma centena de pessoas à sua frente de testa franzida. O jogo começa, os corações disparam numa corrida até ao final e em jeito do que veio a acontecer durante o torneio inteiro os NoA perdem o pistols. shaGuar foi quem Xeqtr culpou. Mas não é de temer. Durante os rounds seguintes jogaram de uma forma incrível e conseguem levar a parte 10-5 seu favor. Destaque para o round em que o Xeqtr consegue limpar dois CTs no BS A, num setup horrível, na minha opinião, que os EYE teimaram em repetir o jogo inteiro.
As partes trocam de lado e os NoA ganham finalmente um pistol. No quarto round destaque para o XeqtR, mais uma vez, que tem a perspicácia de antever um slow B já largamente familiarizado pelo mundo. Contudo, elemeNt precipita-se um pouco e não consegue mais do que duas mortes, com três jogadores de costas. method estava de aw, o que é foi uma muito má compra NO CASO de saber que setup queria XeqtR fazer nesse round (element no telhado), ou por outra, o que precognizava ele. Acabou por não matar ninguém e os NoA perderam o 3 para 3. A partir daí foram uns quantos bons rounds por parte dos NoA em que para muito serviram shaGuar no meio direita e method no B. Um aparte para o facto da maneira como os NoA geriram o dinheiro, apostando a comprar em rounds que seriam tipicamente de eco, a CT, e nesse caso a opção por defender ainda mais recuado, tentando que os EYE não se apercebessem disso até ser estritamente necessário. Ainda de referência, também, que acabei por ver muito menos vezes o elemeNt a rodar para o BS principal do que é costume nos NoA. Certo é, funcionou.

No segundo mapa, os NoA voltam a perder o pistols. Mas esperem. Aqui é onde XeqtR ganha o jogo, na minha opinião. A sua equipa compra, eagle + kev/helm e se a memória não me falha ele próprio vai simular o round de eco do jogo anterior. O jogador do meio direita roda para o B. Apercebe-se que não é nada e volta. Quando volta tem a eagle do element à espera e não só. Seguiram-se uma sequência de rounds inacreditáveis para os NoA, que sempre que os EYE compraram surgiu uma individualidade a resolver. Caso flagrante dos 1n3’s do method e do shaGuar. Destaque ainda para o shaGuar e a forma como ele previu o último round dos EYE e pediu ao lider “let me go B, i’ll kill one in the banana, they’ll all be coming with deagles” ouve-se perfeitamente no video da final. De facto vinham de eagles, e vinham banana, mas não matou só um. O ímpeto do 5n1 levou os NoA a partirem para cima do sobrevivente e custou-lhes não só três jogadores como um valente susto. Felizmente XeqtR resolveu. E de repente nem turba nem semáforos nem leds: só o mundo, aos pés dos novos campeões.

Quanto ao PainKiller, do que vi – e foi extremamente pouco – há quatro níveis no jogo: o dos “wannabe day dreamers“, o dos pseudo-elite (liderados pelos 4K), o da elite (Fatal1ty, zyz, Stermy, Stelam, etc) e o do vo0. Numa palavra: impressionante.
Pelo Doom3, destaque para rocketboy que mais uma vez limpou literalmente toda a gente, (como já tinha feito com Fatal1ty). Por curiosidade, a única pessoa a representar um clã português, xlo.sErion, ficou no top20.

Espero que não tenha morto ninguém, simplesmente achei difícil resumir um evento como a CPL em umas quantas páginas: falta sempre alguma coisa.

Play hard, go pro.

CPL Winter 2004: Resultados